— Depois dos panos arriados, o espetáculo é sempre o mesmo.
E, se Mestre Zagaia falou, tá falado. Mulher é sempre mulher. E a Dilma Fuleira e a Celeste Bicuda também são, embora à primeira vista não pareçam. Sabe como é. Elas nasceram lesadas da sorte e só pegaram a pior. Bagulho catado no chão da feira nunca fez bem à beleza de ninguém.
Porém (e sempre tem um porém), não foi a condição de bagulho que impediu que elas tivessem grandes ilusões a respeito de amor. E o galã dos sonhos das duas era, como já disse, o Ariovaldo Piolho. Esse vagau se serviu das duas sem a mínima cerimônia. Foi ali na base do agrião. Como as duas estavam a fim dele, o danado negociou. Fez valer a velha e tinhosa lei da oferta e da procura. Se fingia de morto e esperava pra ver quem comparecia no seu enterro.
Como quem não quer nada, pegava a grana na mão da Dilma, cumpria a obrigação e ia buscar os pixulés com a Celeste. E se o dinheiro compensava, não deixava ela em falta. Até que o caldo engrossou.
Bateu sujeira. O doutor delerusca resolveu acabar com o pesqueiro das piranhas e a Dilma Fuleira e a Celeste Bicuda se viram no papo-de-aranha. Escaparam da cana, mas o faturamento caiu às pamparras. E, no meio disso tudo, o Ariovaldo Piolho sentiu o aroma da perpétua. Vagau escolado por muitos anos de janela é sempre cem por cento profissional. Sem pagório, deixou as mulheres na saudade. E se deu o esquinapo.
A Dilma Fuleira achou que o Piolho não queria nada com ela porque estava enredado pela Celeste Bicuda. Procurou a rival e, sem conversa, deu-lhe uma tremenda biaba. A Celeste Bicuda era encardida. Encarou, mas não deu nem pra saída. A Dilma Fuleira era gordona e alta. A Celeste, baixinha e só pele e osso. Teve que apanhar e correr. Porém, como não era de engolir nada enrolado, a Celeste Bicuda tramou a forra. Foi na macumba levar o nome da Dilma Fuleira pra sua mãe-de-santo enterrar no cemitério. Feita a façanha, a Celeste Bicuda se botou a boquejar nos botecos. Garantia pra quem duvidasse que a Dilma Fuleira ia murchar até morrer. E não faltou fuxiqueiro pra ir rapidinho envenenar a Dilma. E ela, que já estava atolada até o gogó no pântano, acreditou que a bananosa toda que curtia era devido à mandinga da Celeste. Se picou de raiva e jurou pela luz que a iluminava que ia pegar a inimiga e dar pancada até ela desenterrar seu nome. E foi pra guerra.
A Dilma encontrou a Celeste no seu barraco e nem pediu licença. Entrou na força bruta e foi botando pra quebrar. De repente, a Celeste Bicuda deu uns gritos, uns pulos pro alto e, quando desceu, era uma fera batusquela. Passou a mão numa enxada e tocou o bumba-meu-boi no lombo da Dilma, que se viu obrigada a dar pinote. Mas a Celeste foi na captura e derrubou o barraco da Dilma a enxadada. Em desespero e apavorada com a fúria da Celeste Bicuda, a Dilma se refugiou na casa do Piolho. A Celeste não tomou conhecimento. Aliás, ainda ficou mais endoidada de ver a rival junto do homem da sua gama. Aumentou o escarcéu.
O Ariovaldo, sem se afobar saiu de fininho e chamou a polícia. A cana chegou e ferrou a Celeste e a Dilma. No Distrito, a Celeste falou que não tinha nada com a briga. Foi o exu da sua crença que encarnou nela pra acabar com a Dilma. A Dilma, de zoeira, entregou tudo como era. Disse pro doutor que a bronca era por causa do Piolho, que estava na fita como testemunha. O delegado quis saber se o Piolho tinha emprego. Não tinha. Entrou em pua e as mulheres foram dispensadas. Mas continuam pelejando por amor. Uma visita o vagau às quartas-feiras; a outra, aos domingos. E todas as duas levam o santo dinheirinho de presente pro Ariovaldo Piolho, o bom amante.”
Plínio Marcos
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