Os ignorantes e o homem comum não têm
problemas. Para eles na Natureza tudo está como deve estar. Eles compreendem as
coisas pela simples razão delas existirem. E, na realidade, não dão eles provas
de mais razão do que todos os sonhadores, que chegam a duvidar do seu próprio
pensamento? Morre um dos seus amigos, e como julgam saber o que é a morte à dor
que sentem por o perderem não acrescentam a cruel ansiedade que resulta da
impossibilidade de aceitar um acontecimento tão natural... Estava vivo, e agora
encontra-se morto; falava-me, o seu espírito prestava atenção ao que eu lhe
dizia, mas hoje já nada disso existe: resta apenas aquele túmulo - mas repousa
ele nesse túmulo, tão frio como a própria sepultura? Erra a sua alma em redor
desse monumento? Quando eu penso nele é a sua alma que vem assolar a minha
memória? O hábito traz-nos de novo, contudo, ao nível do homem comum.
Quando o seu rasto se tiver apagado - não
há dúvidas de que ele morreu! - então a coisa deixará de nos incomodar. Os
sábios e os pensadores parecem portanto menos avançados que o homem comum, já
que eles próprios não têm a certeza, em relação a si mesmos, do que pretendem
provar... Sou um homem. Mas o que é um Eu?, e um homem? Eles passam metade da
sua vida a analisar, uma a uma, as mais pequenas coisas, a verificar tudo o que
já se sabe; e a outra metade, passam-na a colocar os fundamentos de um edifício
que nunca chega a levantar-se...
Eugène Delacroix, in 'Diário'
Eugène Delacroix, in 'Diário'
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