O Carácter não se Revela no muito Consumir, mas no muito Criar


 A primeira regra do carácter é a unidade - ou, nas palavras de Goethe, «ser um todo ou juntar-se a um todo». E a segunda, avançar, nunca recuar. Essas duas regras traçam uma linha de desenvolvimento em ascensão, da qual o homem de valor pode desviar-se numa certa medida, não tanto, porém, que os desvios enublem a regra. No primeiro grupo de instintos, por exemplo, poderá ser admitido o da limpeza, embora seja instinto com raízes no impulso negativo da repugnância. «Na criança - diz Nietzsche - o senso da limpeza deve ser estimulado vivamente, porque mais tarde florirá sobre aspectos novos até às alturas da virtude.» O asseio está próximo da devoção; e como é, se não há deuses? Mas não queremos chegar ao ascetismo de um banho frio perpétuo, nem que nos tornemos Apolos do cabelo bem penteado, nem vítima das manicuras; e sentiremos sempre uma secreta inveja daquele estadista teólogo que não deixava a sua ortodoxia interferir no seu apetite.

A mesma atitude tomaremos em relação à pugnacidade e à sua espora, o orgulho; temos aqui virtudes, não vícios - que podamos para que se desenvolvam melhor. Nada de impetuosidade briguenta e de presunção; a presunção é o orgulho da vitória apenas imaginária, ao passo que o bom orgulho sobrevém em consequência de vitórias realmente obtidas; e a impetuosidade briguenta é a pugnacidade do fraco. Lutar não significa berrar e dar pancada; os homens fortes distribuem tão prontamente como ganham, encontrando mais prazer em construir do que em possuir; erguem casas para que os outros as habitem e ganham dinheiro para que outros o gastem. O carácter não se revela no muito consumir, mas no muito criar.
Will Durant, in 'Filosofia da Vida'

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