A nós ligam-nos o nosso passado e o nosso futuro. Passamos quase todo o nosso tempo livre e também quanto do nosso tempo de trabalho a deixá-los subir e descer na balança. O que o futuro excede em dimensão, substitui o passado em peso, e no fim não se distinguem os dois, a meninice torna-se clara mais tarde, tal como é o futuro, e o fim do futuro já é de facto vivido em todos os nossos suspiros e assim se torna passado.
Assim
quase se fecha este círculo em cujo rebordo andamos. Bem, este círculo
pertence-nos de facto, mas só nos pertence enquanto nos mantivermos nele; se
nos afastarmos para o lado uma vez que seja, por distracção, por esquecimento,
por susto, por espanto, por cansaço, eis que já o perdemos no espaço; até agora
tínhamos tido o nariz metido na corrente do tempo, agora retrocedemos,
ex-nadadores, caminhantes actuais, e estamos perdidos. Estamos do lado de fora
da lei, ninguém sabe disso, mas todos nos tratam de acordo com isso.
Franz Kafka, in 'Diário (1910)'
Franz Kafka, in 'Diário (1910)'
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