Seja qual for a diferença que exista entre os bons e os maus
exemplos, convenhamos que ambos dão mau resultado. Nem sequer sei se os crimes
de Tibério ou de Nero nos afastam mais dos vícios do que os exemplos
paradigmáticos dos grandes homens que supostamente nos encaminham para a
virtude. Veja-se como a valentia de Alexandre produziu gabarolas! Veja-se até
que ponto a glória de César permitiu actos antipáticos! Repare-se como Roma e
Esparta louvaram virtudes selvagens!
Diógenes criou tantos filósofos
importunos, Cícero citou tagarelas, Pompónio Ático citou pessoas medíocres e
preguiçosas, Mário e Sila, pessoas vingativas, Lucullus, pessoas voluptuosas,
Alcibíades e António citaram debochados e Capão citou pessoas teimosas! Todos
estes famosos protótipos produziram um número enorme de más reproduções. As
virtudes são vizinhas dos vícios. Os exemplos são guias que nos desencaminham
com frequência e, como estamos tão cheios de mentiras, não deixamos de usá-las
tanto para nos afastarmos do caminho da virtude como para segui-lo.
La Rochefoucauld, in 'Reflexões'
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