Admitindo pois que o ânimo desse filantropo
estivesse velado pelo desgosto pessoal que apaga toda a compaixão pela sorte
alheia, e que ele continuasse a ter a possibilidade de fazer bem aos
desgraçados, mas que a desgraça alheia o não tocava porque estava bastante
ocupado com a sua própria; se agora, que nenhuma inclinação o estimula já, ele
se arrancasse a esta mortal insensibilidade e praticasse a acção sem qualquer
inclinação, simplesmente por dever, só então é que ela teria o seu autêntico
valor moral. Mais ainda: - Se a natureza tivesse posto no coração deste ou
daquele homem pouca simpatia, se ele (homem honrado de resto) fosse por
temperamento frio e indiferente às dores dos outros por ser ele mesmo dotado
especialmente de paciência e capacidade de resistência às suas próprias dores e
por isso pressupor e exigir as mesmas qualidades dos outros; se a natureza não
tivesse feito de um tal homem (que em boa verdade não seria o seu pior produto)
propriamente um filantropo, - não poderia ele encontrar ainda dentro de si um
manancial que lhe pudesse dar um valor muito mais elevado do que o dum
temperamento bondoso? Sem dúvida! - e exactamente aí é que começa o valor do
carácter, que é moralmente sem qualquer comparação o mais alto, e que consiste
em fazer o bem, não por inclinação, mas por dever.
Emmanuel Kant, in ' Fundamentação da Metafísica dos Costumes'
Emmanuel Kant, in ' Fundamentação da Metafísica dos Costumes'
Um comentário:
Tá certo. Caridade é um dever? Então vou cruzar os braços e viver da boa vontade alheia!
Tenham paciência... caridade é uma decisão pessoal de livre vontade. Não algo imposto!
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