De que vale no mundo ser-se inteligente,
ser-se artista, ser-se alguém, quando a felicidade é tão simples! Ela existe
mais nos seres claros, simples, compreensíveis e por isso a tua noiva de
dantes, vale talvez bem mais que a tua noiva de agora, apesar dos versos e de
tudo o mais. Ela não seria exigente, eu sou-o muitíssimo. Preciso de toda a
vida, de toda a alma, de todos os pensamentos do homem que me tiver. Preciso
que ele viva mais da minha vida que da vida dele.
Preciso que ele me compreenda, que me
adivinhe. A não ser assim, sou criatura para esquecer com a maior das friezas,
das crueldades. Eu tenho já feito sofrer tanto! Tenho sido tão má! Tenho feito
mal sem me importar porque quando não gosto, sou como as estátuas que são de
mármore e não sentem.
Florbela Espanca, in "Correspondência (1920)"
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