Não é necessário esforçar-se demasiado pela
abundância quando se tem apenas a intenção de agradar, o valor e a raridade são
bem mais consideráveis, a abundância cansa, a menos que seja extremamente
diversificada. Pode até mesmo ocorrer, pelo demasiado número de belas coisas,
que não se goste tanto, e mesmo que se estime menos aqueles que as fazem ou que
as dizem; pois a abundância atrai a inveja que arruína sempre a amizade. Essa
abundância faz também com que não se admire mais aquilo que se achava, de
início, tão surpreendente, pois fica-se acostumado, e aquilo não parece mais
tão difícil.
Em todos os exercícios como a dança, o
manejo das armas, voltear ou montar a cavalo, conhecem-se os excelentes
mestres do ofício por um não sei quê de livre e desenvolto que agrada sempre,
mas que não pode ser muito adquirido sem uma grande prática; não basta ainda
ter-se exercitado assim por longo tempo, a menos que tenham sido tomados os
melhores caminhos. As graças amam a justeza em tudo o que acabo de dizer; mas
de um modo tão ingénuo, que dá a pensar que é um presente da natureza. Isto
mostra-se também verdadeiro nos exercícios do espírito e na conversação, em
que é necessário ter esta liberdade para se tornar agradável. Nada faz notar
tanto a ignorância, e o pouco progresso, que maneiras forçadas, nas quais se
percebe muito trabalho.
Antoine Gombaud, in 'Do Espírito da Conversação'
Antoine Gombaud, in 'Do Espírito da Conversação'
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