Que um homem rico, muito bem sentado na sua
poltrona, acene com a cabeça, ou volte a cara para a direita e para a esquerda,
ou bata fortemente com um pé no chão, e que, uma vez perguntado pela razão de
tais actos, me responda: «não sei; apeteceu-me de repente; foi um movimento
involuntário», compreendo isso muito bem. Mas se ele me respondesse o que
costumam responder os amantes, quando lhes pedem que expliquem os seus gestos e
as suas atitudes, se me dissesse que em tais actos consistia a sua maior
felicidade, como é que eu poderia impedir-me de ver o ridículo de tal
explicação - tal como o exemplo que há pouco dei; se bem que diferente, é certo
-, enquanto tal homem não se resolvesse a pôr termo à minha hilaridade,
confessando que esses gestos não tinham significação alguma. Num repente, com
efeito, a contradição, que é a base do cómico, desaparece; porque não há nada
ridículo em que uma coisa destituída de sentido seja reconhecida como tal, mas
é grotesco atribuir-lhe um alcance universal. Em relação ao involuntário, a
contradição reaparece: não é possível admitir o involuntário num ente racional
e livre.
Soren Kierkegaard, in "O Banquete" (Discurso do Mancebo, sem experiência no amor)
Soren Kierkegaard, in "O Banquete" (Discurso do Mancebo, sem experiência no amor)
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