Justamente porque a literatura se funda
genericamente na ideia, ela é a mais ameaçada das formas de arte, para lá do
que sabemos da sua aparente maior duração. Ou portanto a mais equívoca. Ou a
mais mortal. Porque nas outras artes, a ideia é a nossa tradução do seu
silêncio, o modo de uma emoção ser dita ou seja transaccionável, um modo
irresistível de explicar, uma forma afinal de dominarmos o que nos domina,
porque nomear é reduzir ao nosso poder aquilo que se nomeia. Mas a forma de
arte não discursiva permanece intacta ao nosso nomear. A literatura, porém, é
nesse nomear que começa. Na relação da emoção com a palavra que a diz, o seu
movimento é inverso do que acontece com a música ou a pintura. A emoção de um
quadro resolve-se numa palavra terminal. Mas a literatura parte-se dessa
palavra para se chegar á emoção. Assim pois a «ideia» é o seu elemento nuclear,
ainda que uma associação imprevisível de palavras a disfarce.
Vergílio Ferreira, in 'Arte Tempo'
Vergílio Ferreira, in 'Arte Tempo'
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